Homilia - 17/04/2016 - IV Domingo da Páscoa
O Evangelho de hoje nos apresenta a figura do pastor. Na nossa cultura urbana, talvez, temos certa dificuldade de compreender este Evangelho, porque a imagem do pastor parece ser de outras eras e outro ambiente e não do nosso.
Quando se fala de pastor entendemos que se trata de um homem ou de uma mulher que cuidam de animais. Mais conhecida é para nós a figura do líder, do presidente, do chefe: não raras vezes, é alguém que se impõe, que manda, que manipula, que arrasta, que exige...
E é, justamente, dessas lideranças negativas que Jesus fala e se apresenta como líder diferente, como “Bom Pastor”.
Jesus fez o discurso do Bom Pastor durante uma festa litúrgica judaica, a “Festa da Dedicação”, quando se lia a profecia de Ezequiel. Este profeta criticava aqueles chefes do povo que enganavam o povo com promessas e eram corruptos. “Eu, o Senhor Deus, declaro que estou contra vocês. Tirarei de vocês as minhas ovelhas e não deixarei que vocês sejam os seus pastores. E não deixarei que continuem a ser pastores que só cuidam dos seus próprios interesses. Livrarei as minhas ovelhas do poder de vocês para que vocês não possam devorá-las” (Ez 34,10). É neste contexto que Jesus se apresenta como o Bom Pastor, alguém que anuncia a Palavra de Deus e propõe uma vida nova ao povo.
Este discurso de Jesus provocou a ira dos chefes religiosos e políticos, por isso procuravam matar Jesus. Jesus apresentando-se como Bom Pastor não tem nada de poético, mas se trata de uma profecia corajosa e provocadora no contexto social do seu tempo. Jesus é o Bom Pastor, não um poeta sonhador, ele é o pastor corajoso, o pastor que tem a coragem e o poder de defender, de alimentar e conduzir o seu povo. “As minhas ovelhas me conhecem... e ninguém vai arrancá-las das mãos do Pai” (Jo 10,29).
As dificuldades de aceitar o Evangelho não são características de nossos tempos, da “era tecnológica”. Em todos os tempos, o discípulo do Evangelho nunca teve vida fácil. Todas as leituras da liturgia de hoje nos mostram que a vida dos discípulos de Jesus, como a do Mestre, é uma vida atribulada e perseguida, mas que termina na vitória e na alegria.
A 1ª leitura de hoje dos Atos dos Apóstolos (At 13,14.43-52) pode ser vista como um exemplo do que acontece diante da pregação pelos missionários cristãos da Palavra de Jesus, que é Palavra de Deus. Vimos Paulo e seu companheiro Barnabé falando numa sinagoga de Antioquia do Jesus Ressuscitado. Sabemos que Saulo, perseguidor dos cristãos, se converteu e se tornou o corajoso apóstolo Paulo, anunciador da Boa Nova da Ressurreição. Paulo e Barnabé sofreram as consequências do anúncio corajoso da Ressurreição do Senhor. Foram perseguidos e expulsos daquela região.
Realmente, não só Paulo e Barnabé, mas milhares de outros cristãos foram perseguidos e até massacrados, só porque seguiam e anunciavam o Jesus Ressuscitado.
A perseguição dos cristãos continua e, na África e na Ásia, está cada vez mais intensa. No Oriente Médio, milhões de cristãos são forçados a fugir de suas casas para campos de refugiados lotados e se arriscam pelas perigosas rotas até a Europa.
A Coreia do Norte é o primeiro país do mundo quando se trata de perseguição a adeptos do cristianismo. Mas, segundo uma a organização da ONU, em 2015, o maior número de cristãos mortos por sua fé foi registrado na Nigéria. Foram 4.028 mortes no país, de um total de 7.100 assassinatos reportados em todo o mundo. Das 50 nações listadas pela ONU, as seis em que mais cristãos foram mortos por motivos religiosos estão na África. "Em termos numéricos pelo menos, não em grau, a perseguição de cristãos na região supera o Oriente Médio", diz o relatório da organização.
O apóstolo João, exilado na ilha de Patmos, vê, numa visão, toda essa multidão como uma multidão vitoriosa diante do trono do Cordeiro vitorioso. Ele escuta uma voz dizendo: “Esses são os que vieram de uma grande tribulação. Lavaram e alvejaram as suas roupas no sangue do Cordeiro. Aquele que está sentado no trono os abrigará na sua tenda. Nunca mais terão fome, nem sede, porque o Cordeiro será o seu pastor e os conduzirá às fontes da água da vida. E Deus enxugará as lágrimas de seus olhos” Ap 7,10-17). Foi o que ouvimos na segunda leitura.
Jesus nos é apresentado no Evangelho de hoje com o título de Bom Pastor. Por que Bom Pastor?
Através do nosso Batismo fomos reunidos em torno do Bom Pastor, fomos reunidos na comunidade da Igreja. Naquele dia, o Bom Pastor como que sussurrou baixinho no ouvido de cada um de nós, dizendo: “A partir de agora você é meu, você é minha. E não abro mão disso, nunca mais. Ninguém vai arrancar você de minha mão. Mesmo que você se afaste de meu rebanho, preferindo, quem sabe, o aparente e tentador ‘conforto’ do seu mundinho egoísta, eu vou atrás de você. Pois que não quero que você se afaste, eu não quero que você perca o rumo. Eu quero que você tenha a vida, e vida eterna”.
E nós, que estamos aqui ouvindo a voz do Bom Pastor Jesus Cristo, o que vamos fazer? Qual é nossa resposta?
Numa homilia, durante a missa celebrada em Santa Marta, disse, o Papa Francisco nos deu a resposta,wlw disse: que “os primeiros cristãos tinham somente a força do batismo que lhes dava essa coragem apostólica, a força do Espírito inclusive nas perseguições”.
“Eu penso em nós, batizados; se nós temos esta força, e penso: mas nós cremos que o batismo basta, que é suficiente para evangelizar?”. Muitas vezes “a graça do batismo está um pouco reclusa e nós estamos reclusos em nossos pensamentos, em nossas coisas. Ou, às vezes, pensamos: ‘Não, somos cristãos, recebi o batismo, fiz a crisma, a primeira comunhão, tenho a carteira de identidade. E então você dorme tranquilo: é cristão”.
“Mas onde está – perguntou o Papa – esta força do Espírito que o leva em frente?” Se anunciamos o Cristo, “a Igreja se converte em uma Igreja mãe que gera filhos da Igreja, para que ela vá adiante. Mas quando não o fazemos, a Igreja se converte não em mãe, mas na Igreja baby-sitter, que cuida da criança para fazê-la dormir. É uma Igreja adormecida. Pensemos no nosso batismo, na responsabilidade do nosso batismo”.
Francisco recordou também as perseguições no Japão no século XVII, quando os missionários católicos foram expulsos e as comunidades cristãs ficaram 200 anos sem sacerdotes. No seu retorno, os missionários encontraram “todas as comunidades em seu lugar, todos batizados, todos catequizados, todos casados na Igreja”, graças ao trabalho dos leigos batizados.
“Há uma grande responsabilidade para nós, os batizados: anunciar Cristo, levar adiante a Igreja, esta maternidade fecunda da Igreja. Ser cristão não é fazer um curso para ser advogado ou médico cristão, não. Ser cristão é um presente que nos faz avançar com a força do Espírito no anúncio de Jesus Cristo”, disse Francisco.
Este domingo do Bom Pastor é o “Dia Mundial de Orações pelas Vocações”. Somos chamados a orar, orar muito, mas, por outro lado, não podemos deixar de promover iniciativas pastorais para despertar nos jovens a vocação para a vida religiosa e sacerdotal.
Certa vez, na Praça São Pedro, o Papa Francisco, dirigindo-se aos jovens, perguntou: “Alguma vez vocês escutaram a voz do Senhor através de um desejo, uma inquietação, convidando-os a segui-lo mais de perto? Já sentiram o desejo de serem apóstolos de Jesus? É necessário propor grandes ideais à juventude. Pergunte a Jesus que coisa ele quer de você e seja corajoso. Atrás e antes de cada vocação ao sacerdócio ou à vida consagrada, tem sempre a oração forte e intensa de alguém: de uma nona, de um nono, de uma mãe, de um pai, de uma comunidade...Por isto Jesus disse: “Orai ao Senhor para que mande operários à sua messe”.
“As vocações – explica o Papa – nascem na oração e da oração; e somente na oração podem perseverar e dar fruto. Quero sublinhar isto hoje, que é o Dia Mundial de Oração pelas Vocações”.
Irmãos e irmãs, rezemos para que muitos jovens se entreguem ao serviço do Reino dando suas vidas como consagrados, e assim muitas pessoas possam conhecer Cristo Senhor como Bom Pastor de suas vidas.
Frei Gunther Max Walzer