Homilia - 01/09/2019 - XXII Domingo do Tempo Comum
Às vezes nos achamos importantes demais, nos atribuímos um valor muito acima do que temos e, por isso, nos julgamos merecedores de certos privilégios ou de prestígio. Não que devamos nos desvalorizar, deixando de trabalhar nossa autoestima. O problema é quando pensamos que só nós merecemos ser levados em conta e os outros não.
Quase sempre quem se supervaloriza acaba menosprezando os outros. Daí nasce muita coisa ruim: orgulho, mania de grandeza, soberba, ostentação, autopromoção, arrogância. Levados ao extremo essas atitudes chegamos à tirania, ao autoritarismo, ao despotismo e à ditadura. Tudo isso implica na negação do outro, os demais ficam sem chance de mostrar o que são e os valores que têm, porque, de antemão, já são descartados como “sem importância”. Não têm vez nem voz. Nossa sociedade está cheia de casos assim. A Palavra de Deus, hoje, nos provoca a fazer uma revisão dessas atitudes.
A primeira leitura do Livro Eclesiástico afirma que o orgulho é uma doença sem remédio e recomenda a vivência da humildade, porque só Deus é grande, poderoso e bom. “Na medida em que fores grande, deverás praticar a humildade, e assim encontrarás graça diante do Senhor. Muitos são altaneiros e ilustres, mas é aos humildes que ele revela seus mistérios” (Eclo 3,20).
O trecho do Livro do Eclesiástico mostra a oposição de duas atitudes: humildade e orgulho e propõe a escolha pelo caminho da humildade.
Para o Eclesiástico, ser humilde é compreender que somente Deus é absoluto. Por isso, a verdadeira humildade é a consciência de ser pequeno diante de Deus. Ou seja, fazer-se, reconhecer que a grandeza de Deus nada mais é do que abandonar o orgulho da autossuficiência.
Assim a leitura termina com um convite ao discernimento: “O homem inteligente reflete sobre as palavras dos sábios, e com ouvido atento deseja a sabedoria” (Eclo 3,29).
A humildade é o tema do Evangelho de hoje. Jesus foi convidado por um fariseu para almoçar. Como sempre, os fariseus e os doutores da lei observam atentamente o comportamento de Jesus para ver se conseguem apanhá-lo em alguma falta. Queriam um motivo para censurá-lo. Jesus aproveita a oportunidade e não deixa escapar essa chance para dar aos presentes uma lição de humildade.
Engana-se quem pensa que o Evangelho de hoje é um guia de etiqueta e de boas maneiras em banquetes e recepções. Nada disso! Jesus pensa, aqui, no banquete do Reino, que é preparado pelo banquete da vida; sim, porque somente participará do banquete do Reino quem souber portar-se no banquete da vida!
Ele observou que os convidados se apressavam para ocupar logo os lugares mais importantes à mesa, próximo ao dono da casa. Achavam-se mais importantes que os outros. Não pensavam que podia chegar um convidado mais importante do que eles e o dono da casa lhes pedir que cedessem o lugar a esse convidado.
Permitam uma pergunta: Onde nos sentamos, quando somos convidados para uma festa?
A resposta não é simples, porque existe, em nossos dias, uma cultura de supervalorização de quem está em destaque. É a chamada cultura das celebridades, que elogia, bajula e reverencia quem é famoso, quem tem dinheiro, quem é artista, quem está na mídia. Tem-se a impressão que famosos e famosas são pessoas com um grau de importância maior que o comum dos mortais. Quem assume esta cultura, gosta de escolher os primeiros lugares, porque ali é admirado, bajulado, elogiado, é servido. Mesmo quem não é famoso busca este tipo de coisa: quer ser fotografado perto de algum famoso, alguns copiam o estilo de vestir, imitam o penteado, transformam famosos em ídolos...
É para esse comportamento que Jesus pede atenção: não busquem os primeiros lugares, porque um dia alguém te “desbancará” e a decepção será grande.
“Quando alguém convidá-lo para uma festa de casamento, não sente no melhor lugar. Porque pode ser que alguém mais importante tenha sido convidado. Então quem convidou você e o outro poderá dizer a você: “Dê esse lugar para este aqui. Aí você ficará envergonhado e terá de sentar-se no último lugar” (Lc 14,8-9).
Enfim, Jesus nos convida à virtude da gratuidade e faz uma proposta estranha: “Quando deres um almoço ou um jantar, convida os pobres, os aleijados, os coxos, os cegos” (Lc 14,12-13).
A gratuidade é o exato contrário do cálculo interesseiro de que quem vive se perguntando: quanto é que eu levo nisso? Que vantagem isso me dá?”.
Dizem alguns que gratuidade é ingenuidade, que ninguém faz nada a não ser por interesse. Será?
Todos nós já precisamos algum dia da boa vontade de gente que fez algo por nós sem esperar nada em troca. Todos nós já fizemos algo sem esperar nada em troca, fizemos alguma coisa por alguém por pura generosidade e sabemos a alegria que isso traz ao nosso coração. Para começo de conversa, nenhum bebê sobreviveria sem gente disposta a servir na gratuidade: eles só dão trabalho e não têm como retribuir, pelo menos a curto prazo.
Quem de nós, aprestar um serviço “gratuito”, um favor, uma ajuda, já não ouviu a frase “Deus lhe pague”?
Apesar de todo o egoísmo interesseiro que nos cerca, parece que, intuitivamente, percebemos que Deus tem alguma preferência pelos desvalidos deste mundo e, por isso, se torna o grande fiador de quem não tem crédito na praça. Um provérbio popular diz: “Quem dá aos pobres empresta a Deus”.
Hoje, os relacionamentos são quase sempre feitos em vista do proveito próprio, do interesse. Quando damos algo a alguém que nada pode nos dar em troca talvez o façamos com gratuidade, pois se damos apenas para aliviar a nossa consciência também não é um gesto gratuito. Escolher os pobres sem segundas intenções é uma opção. Essa foi a opção preferencial de Deus.
Através das leitura da liturgia de hoje, Jesus nos deixa duas perguntas como orientação para as escolhas da nossa vida: onde nos sentamos e com quem nos sentamos.
A primeira é a atitude do convidado e, a segunda, é quem convidamos para fazer companhia, quem escolhemos partilhar e repartir o pão de cada dia. é a mesa como ensinamento sobre como podemos orientar a vida, através de nossas escolhas. Jesus coloca, basicamente, duas atitudes: onde nos sentamos e com quem nos sentamos. A primeira é a atitude do convidado e, a segunda, é de quem convidamos para fazer companhia, com quem escolhemos partilhar e repartir o pão de cada dia.
Frei Gunther Max Walzer