Homilia - 13/10/2013 - 28º Domingo do Tempo Comum
As leituras de hoje nos falam do reconhecimento, da gratidão. Desde pequenos aprendemos a dizer “muito obrigado”. Ontem, no Dia da Criança, as crianças receberam muitos presentes. Tenho a impressão que os pais, muitas vezes, só ensinam a dizer “obrigado”, mas não ensinam a ser agradecido. Infelizmente, esta palavra não passa de uma mera palavra. Também conhecemos pessoas mal-agradecidas que nem “obrigado” dizem Estão sendo injustas com muita gente que se esforça para agradar oferecendo uma ajuda.
E nós, quando agradecemos ao Senhor? Como agradecemos ao Senhor? Nossa gratidão também não passa de uma palavra?
Muitas vezes, nosso relacionamento com Deus não passa de pedir favores, coisas consideradas necessárias no momento, como, por exemplo, sucesso nos negócios, cura de doenças, um bom emprego, prosperidade financeira, libertar-se de um vício, passar numa prova etc. Sem dúvida, há muita gente que chega a agradecer.
Agora, com a internet, ficou mais fácil nosso relacionamento com Deus. A gente recebe um e-mail com uma mensagem que no final diz assim: “Repasse esta mensagem para as pessoas de sua lista de contatos e, dentro de alguns dias, você terá uma surpresa”. É a versão eletrônica das tais “correntes”, que fazem de Deus uma “máquina automática de fazer favores”. Nessa compreensão da fé não existe espaço para a gratuidade de Deus.
Olhemos para as leituras de hoje que nos falam da gratuidade de Deus. Ouvimos duas histórias de cura de leprosos. Eliseu cura o sírio Naamã e Jesus cura dez de uma vez.
Naamã não fica apenas curado de sua doença. Descobre Deus e, com ele, uma nova forma de viver. Naamã deseja adorar e servir a esse Deus que se revelou tão bom por meio de Eliseu. A terra que ele pede para levar será o sinal dessa nova opção de fé. Naamã se compromete no serviço de Deus, abandonando os ídolos de seu povo Em sua gratidão, quer primeiro presentear o profeta. Eliseu não aceita: o mérito é de Deus, não é seu. Naamã volta para casa, vendo o mundo de outro jeito, sabendo que há um só Deus para todos e que esse Deus tem compaixão dos doentes, em todos os povos.
Jesus cura dez leprosos e só um se lembra de voltar para agradecer. Jesus pergunta pelos outros nove. Jesus não esperava ser reconhecido e admirado por todos, e não ficou ressentido por não receber um “muito obrigado” depois de prestar um favor. Seria pura hipocrisia fazer um favor para depois ser reconhecido como “benfeitor”. Jesus se admira de que os outros nove agraciados com a cura não tenham percebido que Ele, Jesus, estava revelando uma nova relação entre Deus e o ser humano. O que será que Jesus está querendo? Mais homenagens? Quer que seu poder sobrenatural seja reconhecido?
Ao voltar, louvando a Deus e agradecido a Jesus, o ex-leproso demonstra que algo mais do que a cura aconteceu com ele. Jesus diz a ele: “A tua fé te salvou”. O samaritano retorna, não só para agradecer, mas para manifestar sua profissão de fé na pessoa de Jesus. Não era simplesmente a cura de uma doença, por mais terrível que fosse naquele tempo. Trata-se de uma mudança de rumo, admitiu seguir uma nova proposta de vida que tinha sua origem em Jesus. O ex-leproso sentiu-se novamente acolhido na sociedade. Isso foi possível porque houve, da parte de Jesus, respeito, acolhida e compaixão, e da parte do ex-leproso, busca, confiança, coragem e gratidão.
Naamã servirá somente ao Senhor e o samaritano se compromete a seguir Jesus, vendo nele o revelador da gratuidade do Pai.
O Evangelho nos mostra que nem todos agradecem pelo bem recebido. Mas como podemos louvar o Senhor e agradecer quando o sofrimento nos rodeia de todos os lados? É possível agradecer a Deus mesmo na provação? Faz sentido cantar e louvar a Deus se a cada dia vemos tanta miséria, sofrimento, injustiça, violência?
É fácil ser agradecido quando se recebe algo bom. Mas como podemos acreditar no Deus da vida e do amor, da paz e da justiça, como podemos agradecer a Deus, quando estamos sendo incompreendidos, perseguidos, maltratados e até mortos? Nós, aqui, talvez não sofremos nada disso, estamos até muito bem, graças a Deus. Mas quantos irmãos nossos, à nossa volta, não têm nenhum motivo para serem agradecidos. Quantos estão sofrendo terrivelmente, e não conseguem entender o porque de tanto sofrimento? O que vamos dizer a esses irmãos?
A segunda leitura de hoje nos ajuda a encontrar uma resposta a estas questões. Quem está sofrendo provações, como poderá reconhecer a presença deste Deus que ama, que cura, que quer estar presente em nossa vida em todos os momentos? O sofrimento e a morte de gente inocente desafiam constantemente a nossa fé no Deus da vida. Quantos se consagraram à causa do Reino de Deus, enfrentando os maiores sacrifícios e renúncias, por amor a Deus, e acabam sendo vitimados por doenças incuráveis, aborrecimentos, dores, perseguições e martírios sem fim? O que pensar disso?
São Paulo escreve a seu amigo Timóteo: “Lembra-te de Jesus Cristo, pelo qual eu sofro... É por isso que tudo suporto...”. Paulo está preso, algemado por causa da propagação da Palavra de Cristo, como se fosse um malfeitor, mas se alegra porque vê nisso uma oportunidade para que outros consigam descobrir o grande amor de Deus por nós. Sei que não é fácil fazer do sofrimento um ato de amor, um ato de entrega a Deus. É difícil aprender a lição do amor no sofrimento olhando para a cruz.
Quem “entende” a cruz descobre o sentido do sofrimento. A solidariedade de Jesus com todos os sofredores é a garantia de que não seremos decepcionados. Jamais agradeceremos ao Pai os sofrimentos pelos quais passamos, pois não é isso que Ele quer. Mas podemos agradecer-lhe pela força que nos dá e pela certeza de que “lutar não foi em vão”.
Frei Gunther Max Walzer, Ofm